Isaías 54:10 “As montanhas podem desaparecer, os montes podem se desfazer, mas o meu amor por você não acabará nunca, e a minha aliança de paz com você nunca será quebrada. É isso o que diz o SENHOR, que tem amor por você.”

Nova Tradução na Linguagem de Hoje

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Há vida na sequidão

Se você já andou pelo sertão na época de estio verá uma paisagem melancólica. Tudo tem aquela cor ocre de barro e poeira; o chão, a pouca água, a vegetação, as casas e até os homens... O mato é seco, é comum ver-se ossada de animais que não resistiram à sequidão... Nada desta paisagem inspira vida. Neste cenário boa parte dos indivíduos urbanos não suportaria habitar... Seria tomada de desolação, solidão e angustia. Já passei várias vezes por este retrato, emoldurado pela janela de um ônibus ou carro, minha vista se perdia lá no meio das capoeiras, dos galhos retorcidos, da terra rachada, das pequenas casas pingadas aqui e ali... Muitas vezes pensei: Meu Deus, isto é lugar onde se viva? Até que vivi lá. 

De fato não se verá possibilidade de vida ali até que se embrenhe na caatinga, veja-se o carcará, o preá, o tatu, a raposa; até que se desça do urbanismo, monte-se um jumento, apeie-se e entregue-se a empatia com o sertanejo, ouça-se o mugido ou o balido dos animais. Há vida na sequidão.

Não olhamos a aridez com bons olhos, porque não conseguimos vislumbrar a vitalidade que nela reside, da qual o verde é apenas um dos cenários, o mais desejado, mas não o único. O gérmen da vida reside imortal na secura do semi-árido. Basta que venha a chuva para tudo reverdecer. Mas não foram as águas pluviais que trouxeram a vida... ela estava nos galhos retorcidos.

Como cristãos modernos fomos habituados ao discurso triunfalista. Qualquer figura associada a deserto, vale, escuridade não combina com nossos conceitos de vitória. Entendo que buscamos um objetivo melhor, um novo amanhã... mas é na viagem que aprendemos e não no destino. Com isso rechaço o pensamento de que nossa sequidão de estio pessoal ou coletiva seja um momento a ser simplesmente lamentado, já que nossa meta é a primavera. Pasmem, creio que nossas estiagens devem ser celebradas como estações necessárias à alma, é nelas que a mesma mostra sua resistência, é nelas que escolherá se será doce ou amarga... O sertão deixa o sertanejo resistente, mas não menos terno...(Hay que endurecerce pero sin perder la ternura jamás - Che)

É na sequidão que decidiremos se será renovada a esperança ou sucumbiremos sob o sol causticante. Ainda na seca o sertanejo destila seu suor no preparo da futura plantação... Ele tilinta sua enxada no solo faiscante, arremete a foice contra os caules duros da caatinga, usa a chibanca para remover os tocos... sabe que se ficar apenas olhando as nuvens não vai plantar nem colher; ele luta para mudar a paisagem e suprir-se. Em relação a nossa alma, é tempo de sulcar nossos corações, brocar e remover sentimentos daninhos enraizados a anos, mudar posturas ... O sol é pinicante na moleira, mas não racha a esperança do sertanejo.

É na estiagem que a devoção será mais genuína. É fácil passarinho cantar refestelando-se nas imensas poças de água e abundancia de frutinhas, sementes e insetos. Mas é na ausência de suprimentos que tiraremos a duvida se nascemos pra cantar.

É no verão que descobriremos se temos vida em nós mesmos. O sertão tem vida própria. Talvez não exuberante sob alguns pontos de vistas. Mas a vida está lá. A chuva apenas lhe dá outra roupagem. A quem tem vida abundante como uma fonte interna, as bênçãos externas serão sinais da graça e não a própria graça.

É na sequidão que daremos provas de amor ao nosso chão (raízes). O sertanejo reluta antes de arribar-se: “Eu vou ficando por aqui... Que Deus do céu me ajude... Quem sai da terra natal em outros cantos não para... Só deixo o meu Cariri No último pau-de-arara...” A seca é uma oportunidade de consolidar nossas decisões... poderemos ficar, sofrer, ver morrer, e no fim puxar sobre si o lençol do barro duro que amou... ou então largar tudo, migrar, sair-se, mudar-se... mas, e se depois o sertão virar mar?

Por fim, a sequidão é quem realça (valoriza) o milagre da chuva. O verdume é mais reverenciado onde é raro, o ribeirinho é mais desejado e respeitado quando temporário, a água é mais saborosa quando antes se provou dela salobra ou tingida de barro, o pão de milho é mais forte quando vitaminado por suor e lágrimas, os laços são mais fortes sob o risco constante da partida e da saudade, a vida é saudada com mais entusiasmo quando correu o risco de virar osso branco.

Graça e Paz!

Um comentário:

  1. infelizmente parec q buscamos a Deus cm mais intensidade, cm mais necessidade quando estamos na estiagem... e perdemos muito por isso...

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